terça-feira, 28 de abril de 2009

a quem me dou


sou

viagem contínua
num esvoaçar liberto

estrada cansada
molhada num deserto

nuvem ligeira
que o sol pintou

sou, a vida inteira
tecida a quem me dou

ruisantos

segunda-feira, 20 de abril de 2009

conheço

Conheço quem me faz rir
Na patética busca do equilíbrio
Entre a carne e o ser

A carne quer carne
O espírito sonha
O homem sofre
Seduzido pelo desejo
Vagueia em labirintos compactos
Na esperança de saber quem é
Perder-se na esteira do tempo
Esquecer-se das razões
Que o fizeram parar
De pensar
E ousar

A carne quer carne
Como o espírito quer vida
Eterno sonhador
De sorriso franco e aberto
Em ténue equilíbrio
Entre a alma, da alma
E a alma do corpo
Insaciável na busca da ilusão
Que alimenta o sentir
Desassombrado e real

Em assomos de virtude
Rompe a âncora lamacenta
Lufadas de espuma límpida
Embalam, queimam, quebram
Horizontes azuis indolores
Despontam…Convidam
Caem as trevas

Descobre a paz
Ao alcance de um dedo
Amor
Basta amar
Sonhar
Basta querer
Plana montanhas
Voa no limite
Incólume á carne
Egoísmo, inveja, injustiça
Adormece

Abalado pelo dia
Acorda
A vaga é alta
Âncoras nascem
O homem oscila
Sorvendo aromas
Secando sal

Não, não pares
São as dores do caminho
São os dias de parto
É o preço da liberdade
Comprada a pulso
Nas encruzilhadas da vida

E o homem chora
Pela raiva, que faz calar
Nos sussurros da carne, que ri
Pelos gritos do espírito, que vive

Conheço quem me faz rir

Sempre o conheci

ruisantos ( 1996)

Na lomba do tempo

instantes
segredos revelados
numa lomba do tempo

expiram
quando a mão adormecida
desiste da liberdade segura

envolve-te
na raiz que semeias

inspira-te
na força serena que és

vive
no risco da dor, rasgada
de quem vive, sem amarras

parte
para o recomeço imprevisto
de doces instantes, por dizer


raiz de luz, serena
história solta, por contar
louca manhã, incontida
um passeio, até ao mar

ruisantos

sexta-feira, 17 de abril de 2009

formas de sentir

o amor
é uma continuidade de prazer
que suplanta
a dor da distância

rs

Embrulhinho



Querida L,

Fui-te ver quando tinhas apenas um dia, doce embrulhinho cor-de-rosa, enroscado na sua mãe. A “Mãe” já mal disfarçava a sua preocupação contigo, relevando para segundo plano o seu próprio desconforto. Assim vai ser durante toda a tua vida...mulheres guerreiras olhando cuidadosamente pelas suas crias, velando sempre por ti, quando mais precisares e menos esperares.
Ao longo dos anos serão muitas as vezes em que se exasperarão uma com a outra, mas fica sempre segura de que ela quer-te desde o primeiro dia, acima de tudo e todos, que o teu lugar será sempre o primeiro, mesmo quando tiveres já voado para fora do teu ninho.
Eu bem vi os seus olhos brilharem apesar do seu cansaço, quando postos naquele embrulhinho cor-de-rosa. Já uma frágil guerreira pronta para um novo papel na sua vida: a “Mãe”! Justamente orgulhosa da sua obra...a sua Nô, de inocentes olhos negros, aconchegada nos seus braços. Quanto carinho eu vi nos olhos da mãe e da avó. Foi tanto que me comovi, acredita.
Bem vinda ao mundo Leonor!
Foste recebida com honras de princesa e assim serás para sempre. A vida tem coisas más, eu sei, mas também tem uma beleza indescritível, cheia de cor, luz e belos sons. Serás rodeada de verdadeiro amor e carinho, estou certa, tendo tudo o que mereces, pois zelarão por ti guerreiras para quem serás sempre um doce sopro de alegria.
Nestes momentos tenho imensa pena dos homens, da sua incompreensão, dos seus medos tolos, de tudo aquilo que, sem sequer saberem, acabam por perder.
Sê feliz minha linda flor.


MP

pensamento no vento




Uma sombra incontida
num doce deslizar
uma palavra, um caminho
pintado, de sal e mar

Uma viagem no espaço
uma lágrima que rola
um leve embaraço
numa gota que se solta

Um sorriso, uma loucura
um amor de paixão
que nos move em ternura
sem quê, ou razão

Comigo levo momentos
pedaços de saber
tiras de uma vida
cansada de correr

Sou pensamento no vento
chuva farta, em lago florido
uma força que desenho
nas margens, do tempo vivido

Sou quem te ama
sem pudor de te amar
sou apenas eu
neste simples navegar

ruisantos

terça-feira, 14 de abril de 2009

Margarida

Oh Margarida,
Estou certa de que estás bem acompanhada, enquanto tantos de nós aqui sózinha no meio desta louca multidão. Podias ter ficado por cá mais tempo. Podias ter-te despedido, mas eu compreendo que não te deram tempo para o fazeres. Um dia iremos ter contigo. Sei que nos esperarás e receberás bem quando chegarmos, não nos levando a mal a longa espera a que te sujeitamos.
Tu és uma gaivota livre e nós incapazes de nos libertarmos das amarras fúteis desta vida efémera que levamos, dos nossos fardos e “prazeres” que no final a nada levam. Mas é preciso ficar...garanto-te! A chama precisa arder penosamente até ao fim.
Temos saudades da tua voz de passarinho...asas de vento, coração de mar...
Quem escreve sou eu, a papoila, mas todos pensamos diariamente em ti, e por vezes choramos.

MP

Talvez


Talvez

Não quero tudo
Ter tudo é perigoso
Pois quem tudo quer
Tudo pode perder
Mas queria mais
Mais um pouco apenas
Porquê tão perto e tão longe
Tanto de mim para dar
Tanto de ti para receber
Esses momentos de silêncio
Esses abraços fortes
Que não querem nunca soltar-se
Fazes-me falta
Sempre fizeste
Mesmo quando eu não sabia
Que era de ti a solidão que sentia

MP

reflexos de sol, em ti



M,
Estou aqui sentada na esplanada, apanhando o sol da tarde, olhando as águas azuis e tranquilas do Tejo, vendo os veleiros chegarem e partirem. Debaixo da esplanada flutuante a água é verde e nela nadam pequenos peixes em cardumes. À minha frente, dois apaixonados trocam olhares de fome e desejo, deixando que as suas mãos se toquem quase distraidamente. O calor do sol aquece-me e tranquiliza-me. Sinto apenas a tua falta … das estrelas que brilham nos teus olhos, do teu sorriso aberto, da tua voz lenta e profunda, dos teus lábios frescos e carnudos e desse teu narizinho delicioso.
Fecho os olhos e evoco a tua imagem … já a conheço de cor. Lembro-me das tuas mãos , as quais nunca sabem bem onde se colocar, das tuas pernas macias e musculadas, da forma como fechas os olhos mantendo-te sempre nervosamente alerta. Raramente em paz, sempre preocupado...meio ausente.
Vives intensamente, sempre sem tempo, correndo tímidos riscos, provavelmente para te certificares de que continuas vivo. Como gostaria de te oferecer paz, de que aprendesses a saborear a tranquilidade e o silêncio. Eu sei que saberia ensinar-te, mas a tua vida está traçada para viveres a correr sem olhares bem o que se passa em teu redor. Até os teus prazeres são rápidos e intensos...cronometrados.
Serás feliz? Será que algumas vez pensaste nisso, será que alguma vez te atreveste?
Bem sei, talvez melhor que ninguém, que a felicidade é efémera, mas sempre existem momentos...momentos inéditos e deliciosos que não se compadecem com o relógio.
Somos tão diferentes...


MP

“quase” não passa de um jogo


Olá P,
Sei que estás sempre por perto, pois aquilo que partilhamos não é coisa de subestimar, mas sim algo mais íntimo e pessoal do que a própria intimidade entre um homem e uma mulher. Não passa um dia em que não pense em ti ou nas tuas palavras, pois o vínculo entre nós não foi fruto de acordo assinado, nem se manifesta pela proximidade física. Aliás, sei bem que ambos nos mantemos afastados deliberadamente, um pouco por receio da proximidade que poderá advir de cada vez que estamos os dois juntos.
Falas-me dos teus amores e das tuas paixões, aquelas que entram e saem da tua vida a um ritmo que me parece veloz...enquanto eu vou pairando, sempre no meu papel, num lugar que mais ninguém ocupa.
“Já gostei mais do que gosto...mas sim, estou numa relação tranquila”. Na realidade, penso que fantasias e nos enganas de propósito, pelo puro receio do risco de uma aproximação maior. Eu limito-me a fingir que acredito, pois também eu acho pouco prudente chegar mais perto.
As palavras que trocamos não passam por mais ninguém e eu conheço a tua alma, aquilo que finges teimosamente não ser, a tua insegurança e esse teu jeito falsamente abrutalhado quando necessitas de voltar a ter-me mais próximo de ti.
Sei que mesmo de longe, me olhas tal como eu a ti...me vais vigiando e por vezes chamas por mim, requerendo a minha aprovação para afastar as tuas inseguranças, ou para testar o equilíbrio de forças entre nós...mas tu sabes que eu preciso de ti, de saber que estás por aí, de ler as tuas palavras que aquecem os pedaços do meu coração.
“Esteve quase”, disseste tu. Mas “quase” não passa de um jogo, que tantas vezes surge em momentos mais solitários da vida, também com estas se desvanecendo.
Quero-te bem...sempre. Mas tu sabes...

MP

fugas e momentos


M,
Não chega! Não chegam para me preencher, os encontros fugazes e ritmados, umas escassas horas de amor “roubadas”, umas conversas breves, umas mensagens. Não chega sequer para iludir que existe algo um pouco mais intenso. Uma atracção, um desejo que todavia não chega a transportar ansiedade.
O investimento é insuficiente, prevalecendo os sentimentos racionalizados e devidamente colocados nos intervalos convenientes da vida. Essa vida real e responsável, compartimentada nas suas prioridades: trabalho, família, amigos e lazer. Eu não faço parte de qualquer uma destas vias, na vida de quem quer que seja. Tenho vindo a afastar-me com um certo sucesso, do qual me orgulho, pouco ou nada reagindo às vozes que ainda me provocam no sentido de re-haverem o meu investimento pessoal. Também contigo eu sou cordial e dócil, tendo as palavras ou os gestos deixado de me tocar e muito menos magoar. São apenas lamentáveis as coisas que por vezes se dizem, as atitudes que se tomam. As palavras não são sentidas, sendo usados superlativos e excessos, que em pouco ou nada correspondem à realidade. Eu sou rigorosa com as palavras, tratando-as com tanto ou mais respeito do que trato as pessoas, usando-as com parcimónia e honestidade.
Aqui há algo de errado, algo que não é dito, algo do qual apenas se foge. Não censuro as fugas dos outros quando eu própria sou perita em fugir, no entanto sei que as fugas significam em si uma inquietação e o pressuposto de um retorno a porto seguro. Fugas são apenas momentos. Bons sem dúvida, mas não se pode pretender que sejam mais do que isso mesmo...pequenas fugas a um quotidiano insatisfatório e insípido, a uma vida segura, todavia monótona e falsa. É sempre fácil demais assumir a falsidade como se da verdade se tratasse. Difícil arrasar o mundo e começar de novo sobre os destroços da devastação. Difícil demais para quem já esgotou os esforços em tempos de guerrilha infinda.
Tudo isto pouco ou nada significa para além de fado ou novela barata. Apenas mais uma pequena faísca na escuridão da vida pela qual, bem ou mal, optamos. Por mim, sou pedra e jamais me iludirei com palavras, pois conheço-as bem e sei do seu poder efémero.
Corações partidos não amam. Corações desiludidos jamais se voltam a iludir. Tudo o resto são momentos que acabamos, mais tarde ou mais cedo, por apagar da memória, regressando às seguras pedras da calçada que nos habituamos a pisar tomando-as como certas e seguras até ao dia em que, subitamente, nesse mesmo chão se abre um buraco intransponível do qual não há retorno possível. Não deixa então de ser espantosa a resiliência e capacidade de adaptação de cada um perante os erros cometidos.
Porém, é aí que começa a verdadeira cruzada da infelicidade...quando amargamente tomamos consciência de tudo aquilo que perdemos e não mais poderemos re-haver... de tudo o que poderia ter sido e cujos caminhos acabamos por destruir inexoravelmente.

MP

sábado, 11 de abril de 2009

encantos


A,
Por vezes a vida surpreende-nos colocando no nosso caminho pessoas inesperadas e diferentes daquelas que habitualmente encontramos. Quando tal sucede, torna-se impossível não sermos tomados de uma certa curiosidade e atracção. A experiência de uma vida permite-nos concluir que, basicamente, os homens são semelhantes guardando traços comuns que podemos antecipadamente esperar, e reconhecer com um sorriso no momento que eles se apresentam. Porém, existem ocasionalmente seres que, de alguma forma, nos surpreendem com gestos e aspectos audaciosos e inesperados.
Foi o teu caso.
Seria pretensioso dizer que és diferente de todo o mundo, pois todos temos emoções e formas de estar em comum. No entanto surpreendeu-me a tua sinceridade e abertura, a forma honesta e frontal como te afirmas, a prudência (certamente ditada pela tua própria experiência de vida), o gosto despudorado pelos prazeres da vida. Tens uma forma generosa e fácil de partilhar as tuas emoções e os teus sonhos, como se sempre tivesses acreditado e confiado em todos aqueles que atravessam o teu caminho. Há nesta forma de estar, alguma ingenuidade que me desperta carinho e vontade de estar. Estar contigo é fácil e agradável.
Momentos ocorreram em que me apeteceu abraçar-te, pois é esta a melhor forma por mim encontrada, de receber e dar, de partilhar o sentir que vai para além das palavras. És especial sim, na forma corajosa de te afirmares e nessa notável capacidade de te expores de um modo tranquilo. Porém, persiste um aspecto muito curioso...um aparente fosso, uma barreira protectora colocando afectos profundos de uma forma distante e por vezes até...fria...
Perante isto, o que eu sinto é uma certa relutância face à atracção despertada. Um homem complexo seguramente, cujo trajecto de vida o torna indeciso. Um homem pelo qual terão passado oportunidades que deixou esgotar, talvez por não ter bem a certeza se as deveria ou não aproveitar.
Uma carência grande de proximidade, ternura e partilha. Um certo desencanto com os outros...enfim uma certa solidão e isolamento.
Temos algumas coisas em comum, as quais não sendo muitas, são profundas e relevantes. Eu sou uma boa pessoa, generosa e frontal, porém, uma inimiga implacável e temível. Tu és uma pessoa boa...muito melhor que eu...
Procura ser feliz!
MP

quarta-feira, 1 de abril de 2009

barca

Amor é uma barca
com vela enfunada de beijos
Voga por ondas alterosas
aproada á luz que a guia
Transporta planos
lágrimas e risos
razões, emoções e ilusões

Não tem hora de chegada
nem dique que a faça parar
Livre leve e fluida
bolina para avançar
Leva mapas na bagagem
de portos por aportar

Barca louca e sensata
barca simples de amor
Esta é a minha barca
pintada da tua cor

ruisantos

voltas da vida

cada dia tem a sua noite
cada noite, um amanhecer
são voltas que a vida dá
para ensinar a viver

rs